O direito de habitação conferido ao cônjuge sobrevivente está previsto no Art. 1.831 do Código Civil, garantindo que o sobrevivente possa continuar habitando o imóvel que residia com o falecido, tal direito independe da modalidade de regime de casamento, protegendo assim o cônjuge de ser obrigado a deixar o imóvel ou vender.
Além disso cabe destacar que o direito real de habitação é gratuito e vitalício, ou seja, o cônjuge não paga aluguel ou qualquer outro tipo de contraprestação pela utilização do imóvel, sendo um direito que se mantém enquanto o cônjuge sobreviver.
No entanto, esse direito não é absoluto e pode ser restringido em algumas situações excepcionais:
Extinção em caso de condomínio:
Quando o imóvel do casal é dividido entre os herdeiros e passa a ser compartilhado, o direito de habitação do cônjuge sobrevivente pode ser extinto, caso haja copropriedade anterior a sucessão. Nesse cenário, o cônjuge sobrevivente não tem mais a exclusividade de habitar o imóvel, sendo propriedade conjunta com os demais herdeiros. Já havendo jurisprudências claras sobre o tema, como na REsp 1.830.0880/SP/2022, que reconheceu a extinção do direito de habitação em situações de condomínio.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA E SUCESSÕES. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEIS . DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. COPROPRIEDADE PREEXISTENTE DA FILHA EXCLUSIVA DO ‘DE CUJUS’. TÍTULO AQUISITIVO ESTRANHO À ATUAL RELAÇÃO HEREDITÁRIA. 1 . Discute-se a oponibilidade do direito real de habitação da cônjuge supérstite à coproprietária do imóvel em que ela residia com o falecido. 2. Consoante decidido pela 2ª Seção desta Corte, “a copropriedade anterior à abertura da sucessão impede o reconhecimento do direito real de habitação, visto que de titularidade comum a terceiros estranhos à relação sucessória que ampararia o pretendido direito” (EREsp 1520294/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2020, DJe 02/09/2020). 3. Aplicabilidade das razões de decidir do precedente da 2ª Seção do STJ ao caso concreto, tendo em vista que o ‘de cujus’ já não era mais proprietário exclusivo do imóvel residencial, em razão da anterior partilha do bem decorrente da sucessão da genitora da autora. 4. Ausência de solidariedade familiar e de vínculo de parentalidade da autora em relação à cônjuge supérstite . 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(STJ – REsp: 1830080 SP 2019/0229193-9, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 26/04/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/04/2022 – Processo de origem 10056303920168260073 TJSP).
Possibilidade de alienação do bem:
O cônjuge sobrevivente tem direito de habitar o imóvel, mas esse direito não impede a venda do bem. Na REsp 1.547.302/SP, o STJ decidiu que o direito real de habitação não interfere no direito de alienação do imóvel. Assim, o imóvel pode ser vendido, mas o cônjuge sobrevivente mantém seu direito de habitação até o falecimento, desde que respeitado o uso do imóvel.
AGRAVO INTERNO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO E POSSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART . 535, DO CPC. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. Observa-se que não se viabiliza o recurso especial pela indicada violação do artigo 535 do Código de Processo Civil de 1 .973, ainda que rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 2. O direito real de habitação não pode ser óbice à extinção de condomínio e à alienação judicial. A existência do ônus real da habitação não impede a alienação do bem, da mesma forma que ocorre com o usufruto . 3. Agravo interno não provido.
(STJ – AgInt nos EDcl no REsp: 1547302 SP 2015/0188925-2, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 22/02/2022, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/03/2022 – Processo 00109830220108260457 TJSP).
Cláusulas de disposição expressa:
O direito de habitação também pode ser restrito por disposições expressas no testamento ou pacto antenupcial. Por exemplo, se o falecido deixar uma cláusula que condicione o direito de habitação à ausência de herdeiros ou à não necessidade de vender o imóvel para a partilha de bens, o cônjuge sobrevivente poderá ter o direito limitado.
Situações excepcionais de abandono ou má-fé:
O direito real de habitação pode ser revogado em casos excepcionais, como abandono do imóvel pelo cônjuge sobrevivente ou quando ele age de má-fé, não cumprindo as condições necessárias para a manutenção do direito.
Além disso há julgamentos como o do STJ – REsp 2.151.939 do processo de origem 0001423-34.2016.8.19.0000 – TJRJ, onde se reconheceu que o direito de habitação pode ser relativizado em situações excepcionais, como quando o cônjuge sobrevivente tem recursos financeiros suficientes para garantir sua moradia e subsistência dignas. No caso concreto, a viúva, que tinha uma pensão integral do falecido e recursos financeiros adequados, teve seu direito de habitação questionado pelos herdeiros. A decisão do STJ relativizou esse direito, pois as condições econômicas da viúva permitiam sua moradia sem a necessidade do imóvel deixado pelo falecido, beneficiando, assim, os herdeiros. (STJ – REsp 2.151.939 do processo de origem 0001423-34.2016.8.19.0000 – TJRJ).
Tal entendimento em regra não se aplica em situações com vários imóveis herdados, onde a análise do caso concreto determinará a aplicação do direito a residir no imóvel familiar ao qual residia com o de cujus, entretanto tal entendimento demonstra que é possível relativizar a norma. Ante o exposto é evidente que mesmo havendo o direito garantido deve-se verificar a particularidade de cada caso, diminuindo assim a possibilidade que qualquer das partes herdeiras seja prejudica.
Autora: Dra. Cintya Grisoste Mendanha Vieira OAB/GO nº 60.439-A Para mais informações ou dúvidas entre em contato com a nossa equipe através do telefone: (61) 9 8265-7168 Dra. Cintya